XVII Domingo do Tempo Comum

2Rs 4,42-44 Ef 4,1-6 Jo 6,1-15

Pe. Valderi da Silva

Profeta A leitura do segundo livro dos Reis já nos mostra o que a liturgia deste final de semana nos quer indicar. Percebendo atentamente o que nos diz este pequeno trecho ouviremos um adento colocado no texto pelo escritor sagrado: Eliseu, o homem de Deus (2Rs 4,42). Daqui se pode partir para o cume desta liturgia da Palavra, pois, passando pela necessidade do povo, Deus atende o pedido de quem tem fome de pão, pela ação visível daquele no qual a Vontade de Deus reina exclusivamente.

No Antigo Testamento, o povo já experimentara a escassez de alimento, vendo-se privado do que o sustenta no corpo para a vida diária. O profeta Eliseu, homem de Deus que presta atenção ao povo e sua saúde num todo, é sensível a esta miséria, por isso passa a seus irmãos o pão que lhe é oferecido como presente, pede que o deixe aos necessitados. Qual seria o motivo desta atitude de Eliseu? Creio que, primeiramente, por ter compaixão deste povo que sofre com o pouco alimento. Sabe que talvez esta refeição de agora, não solucionará definitivamente o problema, mas oferece mais que pão material a eles. Deste modo, penso que junto a isso, Eliseu oferece o pão da fé, o alimento espiritual que sustenta uma segunda dimensão da vida humana, a dimensão espiritual, já que a dimensão corporal fora saciado pelo pão “multiplicado”.

Eliseu ofereceu ao povo o que Deus enviou, não ofereceu algo seu como se ele fosse o generoso que estivesse dando ao povo o que Deus não dera. É por isso, que Eliseu nem toca no pão, pede que se dê o pão, trazido como presente a ele, para o povo, para que o coma. Aquele homem que trouxe o pão foi quem distribuiu (cf. 2Rs 4,43-44), isto para mostrar também que não era ele quem estava saciando a fome do povo, mas Deus que se utilizou de instrumentos frágeis – este homem de Baal-Salisa e Eliseu – e de alguns pães, para revelar mais uma vez que somente Ele é quem sacia o ser humano.

Jesus nos mostrara como a partilha faz parte da vida divina, pois quando o homem reparte ou faz doação com quem não têm, ele participa sutilmente da caridade e da compaixão de Deus. O profeta é justamente esse homem que inclina-se a agir movido pelo amor de Deus e por isso o milagre se realiza.

No Novo Testamento Jesus é a figura do homem de Deus, que no Antigo Testamento reveste a pessoa do verdadeiro profeta. Nesta passagem do Evangelho de João (Jo 6,1-15) nos encontramos diante de uma das cenas mais famosas do Evangelho, e não é por menos, pois podemos ver nela muitos elementos próprios da figura de Jesus, elementos que nos introduzem no conhecimento da vontade de Deus e sua vida divina. Tentemos nos debruçar sobre alguns destes elementos.

[O olhar de Jesus]

Muitos ressaltam como primeiro elemento importante desta cena de Jesus, sua compaixão pelo povo, assemelhando-se a outro momento do Evangelho em que vê o povo e se compadece deles porque são como ovelhas sem pastor (cf. Mc 6,34). Mas na verdade, o que chama a atenção de modo simples mas profundamente significativo – pois é Jesus quem faz e por isso toma tamanha significado –, é a ação de elevar os olhos ao povo. Nesta atitude esta presente a atenção que se volta para as pessoas, Jesus não é o Mestre que fala para as nuvens, nem se fixa num ponto distante no horizonte, pois sua missão é a de olhar para o povo que Deus lhe confiou (Não perdi nenhum daqueles que o Pai me deu. Também cf. Jo 6,39; 10,28; 17,22).

Este movimento do Senhor, de levar os olhos para a multidão que o seguia (cf. Jo 6,5a) nos apresenta a primeira atitude que faz mover a compaixão. Abrir os olhos para as misérias humanas, não fechar nossos olhos para o que esta ao nosso alcance, tirar os olhos de nossos próprios problemas, de nossas próprias misérias, de nossa própria vida e ver que existe muitos que podem estar nos vendo de longe, e mesmo sem falar uma palavra, nos dizem que estão com “fome”. Esta fome de que falo, deve ser entendida de duas maneiras, assim como a fome que Jesus deseja saciar na humanidade. A fome material, que nasce da carência do alimento para o sustento do corpo. Mas também a fome espiritual, que pode definhar o mais robusto ser humano.

Em nossa vida espiritual sempre ouvimos a palavra de São Paulo “vigiai” (cf. 1Ts 5,6), pois esta vigilância é sinal de que estamos sempre em prontidão e isto deve ser a posição daquele que esta com os olhos levantados de seus egoísmos, podendo ver a própria fome que o definha como também a que enfraquece seus irmãos mais próximos.

No mesmo momento em que o evangelista escreve que Jesus levanta os olhos, diz que Ele viu uma grande multidão que vinha ao seu encontro (cf. Jo 6,5a). Isto figura todas as almas abatidas e cientes de sua miséria que encontram em Cristo o que as pode curar e fortalecê-las novamente. É significativo que a multidão vá ao encontro de Cristo, pois Ele atrai os doentes, os que necessitam de seu auxílio; também é uma atração natural que, vendo o corpo enfraquecer e consequentemente as resistências a Deus, a alma fale mais alto e procure o remédio com Deus.

[A falta de visão dos discípulos]

Perguntando a Felipe onde arrumariam tanto pão para saciar a multidão, diz o evangelista, que Jesus coloca-o a prova. Coloca-o a prova para ver se os discípulos poderiam antever a providência divina, ver que Deus não deixa faltar alimento àqueles que estão junto a Ele.Jesus e a multiplicacao dos paes e peixes

É uma prova para todos os cristãos. Consegues ver o milagre que será feito quando encontramos tantos irmãos com fome do pão material e espiritual? Nossa visão de Deus e de sua providência deve nos levar a acreditar confiantemente na providencia divina, sabendo que Deus utiliza-se de pouca coisa para saciar a humanidade, que ele utiliza-se de homens pecadores que valem “cinco pães e dois peixes”, mas que nas mãos de Deus multiplicam-se em muitos, tantos o suficiente para saciar a necessidade do mundo. A humanidade se ilude com a fartura e a ostentação, a imagem da quantidade é a pedra que impede o ser humano de ser caridoso e compartilhar com seu irmão o que têm, pois não é a fartura que sacia a fome, mas a compaixão e a caridade.

Os discípulos de Cristo precisam sempre renovar sua visão a respeito da ação de Deus, e assim, de como Ele provê a necessidade humana e espiritual dos homens e mulheres. Não é com a ostentação de uma mesa farta, nem com o muito conhecimento acadêmico, mas com a abertura ao outro, ao nosso irmão, é com a atitude de caridade e compaixão, dando-nos chance de saciar nossa própria alma com Seu alimento eterno.

[Figura da Eucaristia]

Esta passagem do evangelho de João em que Jesus realiza o milagre da multiplicação dos pães e peixes, é uma prévia do significado próprio da Eucaristia. Nela temos todos os elementos que podemos perceber neste milagre: a compaixão de Deus, o amor por seu povo que necessita de alimento; a necessidade da fé; a providência divina; o nosso dever de cuidar deste alimento recebido.

A compaixão de Deus pelo seu povo é a mais clara manifestação de seu amor por nós. Foi esta compaixão que o fez tirar o povo eleito da escravidão do Egito, foi esta compaixão que o fez enviar Seu Filho ao mundo e permitir seu escarnecimento e morte para resgatar a humanidade.

Jesus e a multiplicacao dos paes e peixes 2 Sabemos que a palavra compaixão significa padecer junto - cum passio -, por isso ser uma atitude que demonstra ser tão nobre e que mostra o tamanho amor daquele que sente compaixão de alguém. Agora pensemos em Deus sentindo compaixão de nós, evidentemente é infinitamente mais nobre e mais eficaz, pois a compaixão de Deus imediatamente o faz agir enquanto que a nossa compaixão, muitas vezes, esbarra em nossos próprios pecados ou nos alheios. E é por este ato de Deus em nossa direção que Jesus nos saciou, com Sua palavra primeiramente, para logo saciar-nos com seu Corpo e Sangue, a Eucaristia.

Exigência, tanto para o milagre da multiplicação dos pães como para o milagre da Eucaristia, é a . A necessidade da fé é indiscutível para alcançar uma razoável compreensão do significado que estes dois atos do poder de Deus possuem e como isto se insere em nossa vida.

A multidão que se aproximou do Senhor, buscava-o pelos tantos sinais que apresentava por onde passava (cf. Jo 6,2). Possivelmente, a maioria ou muitos deles não pensavam em Jesus como o verdadeiro Messias, ou o próprio Deus que se tinha feito homem. Era mais provável que simplesmente o tinham como um grande profeta que era agraciado por Deus lhe permitindo fazer tais sinais milagrosos. Mas o que não devemos esquecer é que os discípulos estavam ali, e, na pedagogia de Jesus para torná-los aptas testemunhas de Sua palavra, realiza o milagre para que estes possam vê-lo e assim, cresçam na fé Nele.

Esta exigência da fé é sentida quando se trata da Eucaristia, Corpo e Sangue de Cristo, revestidos pelas aparências de pão e vinho. Muitos já tentaram defender racionalmente a suas convicções a cerca da Eucaristia, mas o fato é que não há outro modo de aceitarmos o Senhor, realmente presente na Eucaristia, sem o sentido da fé. Na vida humana, ela se torna um membro da existência, ou seja, assim como temos o ouvido para ouvir, o nariz para cheirar, os olhos para ver, as mãos para tocar, temos a fé para acreditar na realidade que não vemos, nem tocamos, nem cheiramos nem sentimos. O milagre que se realiza em cada Santa Missa é imperceptível àqueles que não aguçam este sentido da fé. Pelo contrário, aquele que soube exercitar este sentido, vê o milagre que Deus todos os dias nos manifesta.

A providência divina é a permanente assistência de Deus e continuo agir Dele sempre em conformidade com o que desde a eternidade pensa para suas criaturas. Pois é por esta providência divina que Jesus dignou-se deixar no mundo este milagre “visível e invisível” ao mesmo tempo. Milagre este que se traduz na vida do ser humano, ao passo que ele toma consciência da existência de Deus e de sua autoridade sobre tudo o que existe. Tendo esta adoração e obediência, o caminho do coração do homem fica aberto para Sua permanente ação em nós e através de nós.

A multiplicação dos pães revela esta providência, que em Jesus Cristo e por meio Dele, saciou o povo, os assistiu em sua necessidade. Hoje podemos dizer, que sacia-nos nem tanto materialmente, mas principalmente promove o avivamento da alma enfraquecida pelo concupiscência.

Como retribuir este grande milagre que a providência divina todos os dias nos oferece? Junto com nossa fé, amor e testemunho de vida, o que nunca podemos deixar é de ter o cuidado com este alimento celeste, a exemplo das palavras de Cristo aos discípulos depois de terem distribuído os pães e peixes: recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca! (Jo 6,13). Na verdade, nossa fé em Deus se demonstrará especialmente nestas atitudes visíveis de acolhimento e zelo pelo que a nossos olhos mortais ainda é invisível.

Estimados irmãos. Que nossa fé se aproxime da de Paulo, professando o Deu Único que oferece a única salvação possível, que oferece a única vida eterna existente. Nos animemos a buscar uma vida reta e sensível a Deus, capaz de aceitá-Lo, ouvi-Lo e decida a fazer o que Sua vontade nos pede, pois confiamos que Sua providencia nunca nos falhará, assistindo-nos em nossas necessidades espirituais e corporais, quando estamos entregues totalmente a Seu amor.

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