“Idiot” de Fiódor Dostoiévski

A obra de Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski realmente é surpreendente, ao menos para este escravo da leitura. Para muitos sua obra é maçante, pesada, algo sem o atrativo que envolve e faz ler “sem parar”, mas os que a consideram desta forma, precisam levar em consideração que Dostoiévski escreve num outro século, num outro continente, inebriado de uma outra cultura tão diversa da latino-americana. Basta lembrar que sua identidade russa é marcante em cada página escrita por ele nos seus mais variados livros.Fiodor M Dostoievski

Uma destas obras que exige fôlego e ânimo para começar a leitura  - e terminar! – é “O Idiota” (Idiot), publicado originalmente em 1868. Suas centenas de páginas podem facilmente desencorajar o mais iniciante dos leitores, por esse motivo penso que uma obra como esta só deve ser lida quando já se tem um prévio conhecimento sobre o estilo do escritor, sobre sua literatura, ou seja, ler “O Idiota” pede-se antes leitura de outras obras menos densas como esta.

Dostoiévski como um verdadeiro russo ama sua identidade russa e por isso sempre encontramos louvores a alma russa mas sem deixar de evidenciar os vícios de uma sociedade muito desigual, onde impera a vaidade, o egoísmo e a negligência de um desenvolvimento conceitual mais claro sobre caridade e solidariedade. Talvez pela própria natureza considerada fria, sem aquele fogo que anima o povo em geral, os personagens vão destilando discursos, disputas e inúmeros comentários para alimentar o ego e tentar justificar as próprias faltas morais.

Neste livro especificamente, repleto de diálogos entre familiares e amigos, percebemos a estéril discussão sobre as próprias qualidades, algumas vezes aparecendo algum adento de cunho questionador, algo que julgo vir do próprio escritor querendo transmitir ao leitor via personagem sua opinião pessoal sobre tal tema trazido a baila. O protagonista chamado Príncipe Liév Nikoláievicth Míchkin – na maioria das vezes chamado somente de Príncipe ou de Míchkin – parece ser o estranho no meio de tanta “produção verbal sem fins”. É tido por idota – donde vêm o título do livro – pois parece sofrer de esquizofrenia, tendo as vezes espasmos e sempre com a saúde debilitada, e talvez por este motivo, sempre se encontrava em desvantagem quando se travava alguma discussão num encontro de amigos, como na casa da família Epantchín. Família esta, que desde o início do conhecimento do Príncipe, simpatizou com o mesmo, especialmente as filhas do casal Epantchín: Aleksándra, Adelaíde e Agláia, esta última, a mais nova, durante os meses de convívio com o Princípe acabara desenvolvendo um sentimento especial por ele, configurando-se em verdadeira paixão, mesmo que a imaturidade da moça, não a deixasse expressar de maneira adequada tal sentimento.O Idiota - F M Dostoievski

O Príncipe também desenvolvera um sentimento complexo por uma mulher chamada Nastássia Filíppovna, que aparenta ser um verdadeiro amor, mas pela dificuldade do próprio príncipe em saber explicar o que sentia por ela, carece de clareza para tal afirmação. De fato, um fim derradeiro e trágico é reservado para tal casal, pois depois de um pretenso noivado frustrado com Agláia, tal príncipe acaba desistindo de tudo para finalmente ficar com Nastássia que confussa pelo que sentia pelo príncipe acaba fugindo dele, mesmo tendo apressadamente combinado com ele a data do casamento para enfim viverem juntos. Esta Nastássia vivia cercada por um homem chamado Rogójin que de modo doentio era apaixonado por ela, resultando que neste derradeiro fim mencionado, ela fugira com ele. O príncipe não desiste de Nastássia e vai a sua procura, encontrando-a na casa de Rogójin. Ali encontra este homem que lhe mostra Nastássia que já se encontrava morta, deitada numa cama, assassinada pelo próprio Rogójin.

Durante o desenrolar do livro existem vários casos particulares que são como que mini-tramas, coisas que diríamos “do quotidiano”. Mas precisamente estas cenas particulares fazem com que o protagonista e os ligados mais diretamente a ele possam ser melhor conhecidos pelo leitor. Em meio a tudo isso, o autor tenta passar com maior riqueza de detalhes possível a vislumbrante e vaidosa sociedade de classe média da Rússia de então.

Porque chamar tal protagonista de “idiota”?

Tentando encontrar uma resposta mais próxima da idéia do autor, penso que “o idiota” do enredo é aquele que mais parece estranho a sociedade em que ele mesmo tenta viver. Sua excentricidade esta não tanto na doença que desde o início ele mesmo diz ter, mas no fato de que aparenta ser um “abobado”, quase que retardado mental diante dos costumes e modo de viver daqueles com quem conviveu. Por isso, penso que os verdadeiros “idiotas”  seriam os que não conseguem ponderar sem suas próprias medidas, culturais, éticas e morais. O príncipe é um “idiota” mediante a sociedade que não consegue perceber a integridade e dignidade daqueles que são fragilizados pela própria natureza, ou que lhes foi imposto tal fraqueza. Na obra, o “idiota” é Liév Nikoláievicth Míchckin, mas na nossa sociedade este “idiota” não seria os inocentes e indefesos?! Os realmente puros de intenção e coração, que facilmente são incompreendidos e até engandos?!

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